Você já deve ter lido sobre o fim do boleto sem registro – isto é, que o boleto não registrado vai acabar da forma como existe. A Febraban informa que a ideia da Nova Plataforma de Pagamentos é “aperfeiçoar o modelo atual com mecanismos que trazem mais controle e segurança a esse meio de pagamento”, de forma a garantir maior confiança e comodidade aos consumidores. O projeto nasceu há 3 anos e vai começar pra valer em janeiro de 2017. Na prática, o boleto registrado vai ser a norma.

O principal ponto que levou ao projeto foram as fraudes, que movimentaram uma verdadeira economia paralela, com quadrilhas especializadas no assunto e muita dor de cabeça para clientes e bancos.

A Febraban informa que as fraudes cresceram em um ritmo tão rápido que o Banco Central exigiu que os bancos melhorassem o produto, caso contrário seria extinto. Em 2014, foram R$ 159 milhões em fraudes. Em 2015, R$ 374 milhões e a estimativa para 2016 é de R$ 523 milhões.

Outro ponto alegado pela Febraban para a reformulação do boleto são as inconsistências – quando o valor ou data de um boleto é alterado de forma deliberada, por exemplo.

Segundo a entidade que representa os bancos, são emitidos hoje cerca de 3,6 bilhões de boletos por ano no Brasil, sendo 40% deles sem registro. Então, muitas empresas serão afetadas com esta mudança.

Os bancos pararam de oferecer a carteira sem registro para os clientes a partir de junho de 2015. Para quem já tinha esta carteira, o procedimento continuou normal. Mas, para 2017, os boletos sem registro só poderão ser recebidos no banco emissor.

Um resumo das mudanças:

  • Dados cadastrais do pagador deverão estar completos – nome/razão social, CPF/CNPJ e endereço;
  • Não serão mais aceitos boletos sem valor ou sem vencimento;
  • Bancos poderão cobrar mais mais taxas, como registro, liquidação, permanência e baixa;
  • O erro vai ficar mais caro, pois os bancos poderão cobrar por cada ação – registro, baixa etc.
  • O boleto precisará ser registrado antes do pagamento – ou pelo menos no mesmo dia até o cronograma ser implementado. Registro e pagamento no mesmo dia funciona (por enquanto), pois o banco processa o registro antes da compensação;
  • Vai haver mais estornos automáticos por inconsistência. O estorno ocorrerá automaticamente na compensação ou imediatamente no pagamento;
  • Um CNPJ fraudador poderá ser bloqueado imediatamente, em vez de em alguns dias como ocorre hoje;
  • Informações de juros e multa serão atualizados automaticamente no momento do pagamento, não sendo necessário atualizar o boleto;
  • Opções de juros, multa e principalmente desconto vão ser limitados aos padrões dos bancos;
  • Ao emitir ou alterar um boleto você terá que registrar no banco usando um arquivo CNAB 240 ou CNAB 400. Terá que aguardar a confirmação que vem em um arquivo retorno CNAB 240 ou 400 no dia seguinte, normalmente junto com as baixas;
  • Na prática, o banco vai automatizar a parte dele e jogar todos os erros para as empresas que precisarão se adequar a trabalhar com o novo boleto.

Os novos boletos serão registrados em uma plataforma compartilhada entre os bancos. Em teoria, o registro do boleto deve acontecer antes do pagamento. Porém, como os bancos não possuem APIs para registrar os boletos em tempo real, registrar no mesmo dia do pagamento será o suficiente, pelo menos por enquanto.

Então, nada de muito drástico muda para quem já emite boletos com registro e possui rotina de enviar diariamente uma remessa ao banco com as informações dos boletos.

 

A palavra da Febraban sobre o fim do boleto sem registro

“A Nova Plataforma de Cobrança trará benefícios para o consumidor e para a sociedade, como maior facilidade no pagamento de contas vencidas, além de evitar o envio de boletos não autorizados”, afirma Walter Tadeu de Faria, diretor-adjunto de Negócios e Operações da Febraban, em comunicado oficial.

De acordo com o diretor, o sistema atual precisava ser atualizado com novos processos e tecnologias. Dentre os benefícios, a Febraban aponta o pagamento após vencimento em qualquer agência bancária, redução de inconsistências de dados, evitará pagamento em duplicidade e vai permitir a identificação do CPF do pagador, o que vai facilitar o rastreamento de pagamentos e, por consequência, reduzir as fraudes.

Por norma do Banco Central, dados como CPF ou CNPJ do emissor e do pagador, data de vencimento e valor serão obrigatórios.

No momento do pagamento do boleto, será feita uma consulta à Nova Plataforma para a checagem das informações. Se os dados do boleto e do sistema baterem, a operação é validada. Se houver qualquer divergência, o pagamento não será autorizado – e o cliente poderá realizar o pagamento apenas no banco emissor da cobrança.

O comunicado da Febraban informa que a Nova Plataforma conta com cruzamento de informações para evitar inconsistências de pagamento, identificação do CPF do pagador do boleto para fins de controle de lavagem de dinheiro e maior transparência na relação com o consumidor, na medida em que melhora os controles dos boletos facultativos (boletos de proposta), que são enviados sem autorização por parte do cliente.

Por fim, a Febraban destaca que o produto continuará contando com o código de barras com 44 posições, o que não acarretará em mudança dos leitores óticos que os emissores contam atualmente.

Quais motivos levaram a Febraban a criar o projeto da nova plataforma?

A cobrança bancária da forma como a conhecemos existe desde a década de 1990, quando foi colocado o código de barras e passou a ser interbancária. De lá pra cá, não houve nenhuma atualização tecnológica. O sistema financeiro entendeu que era o momento de uma atualização na cobrança, visto que hoje o mundo é totalmente digital e a cobrança continua física. Então, o que foi feito? Nós iniciamos estudos para ver qual era a melhor forma de trazer a cobrança para o mundo digital. E a forma que encontramos foi a nova plataforma de cobrança que estamos implementando.

Em um primeiro momento, o boleto físico continuará existindo, mas nós pretendemos, mais à frente (ainda não temos visão desse horizonte ainda), passar a ser tudo eletrônico, sem a necessidade de eu por exemplo receber o boleto impresso do meu condomínio. O próximo passo que a gente pretende dar é acabar com o boleto físico.

Nessa discussão toda, nós levamos em consideração principalmente as demandas do Banco Central. Em 2012 e 2013, o BC soltou duas circulares revisitando toda a norma da cobrança. Com base nessas normas e com base em outra circular de 2009, que exige que qualquer transação financeira tenha identificação do emissor e do pagador, nós partimos para a nova plataforma. Com essa mudança, a gente vai conseguir abarcar também o problema das fraudes, que nós estamos enfrentando nos últimos anos.

Olhando para o futuro, é possível esperar que o boleto seja totalmente online no Brasil? Como você enxerga isso?

O mundo é digital. O DDA já foi uma tentativa de acabarmos com o boleto físico – que infelizmente não vingou por conta do boleto sem registro. A partir da nova plataforma, a gente entende que o DDA deverá deslanchar e se tornar um produto mesmo – e funcionar 100% da forma que a gente tinha desenhado em 2009: apresentar e pagar eletronicamente os boletos, sem precisar ter o boleto (físico) nas mãos.

O DDA foi um produto que não teve muito sucesso. A nova plataforma foi uma forma de trazer o DDA (débito direto autorizado) com uma nova roupagem e nova tecnologia?

Quando discutimos o DDA, em 2009, a ideia já era partir para a eliminação do papel. Só que o DDA só funciona se a cobrança for registrada – se a cobrança for sem registro, não tem como identificar para quem é dirigido aquele boleto. Agora com a nova plataforma e conforme normativa do BC, a de que é preciso ter CPF ou CNPJ do emissor e do pagador e com o registro obrigatório, nós vamos implementar o DDA. Agora este projeto ganha força, com toda a certeza.

Com a nova plataforma sendo implementada, já é possível sentir a diminuição em fraudes. Ou ainda é muito cedo para falar isso?

Ainda é muito cedo. O projeto está em desenvolvimento, não está implementado ainda. O primeiro passo foi parar de oferecer a carteira sem registro. E agora nós estamos trabalhando na reversão da carteira sem registro para a carteira com registro. Isso vai acontecer no decorrer de 2017, com a última entrada em dezembro de 2017. No decorrer 2017 vamos ter ondas, que estamos chamando de roll out, em que boletos acima de determinados valores passarão a ser validados na base (interbancária), deverão estar registrados e ter CPF e CNPJ do emissor e do pagador.

Como você vê a receptividade dos bancos neste projeto?

Nem todos os bancos estão engajados da mesma forma. Nós vemos claramente alguns bancos bem à frente e outros bem atrás.
Veja bem, todos os bancos que são emissores de boleto de cobrança estão dentro do projeto. Alguns estão adiantados, outros menos, mas todos fazem parte do projeto. Nós estamos acompanhando isso de perto.

Sobre boletos sem valor e boleto de proposta. Temos casos de empresas que captam doações, por exemplo. Essas empresas geram o boleto sem valor para deixar o pagador definir quanto vai pagar. Como você vê essa realidade para empresas que trabalham com doações?

Antes de falar sobre isso, eu queria fazer uma ressalva. Primeiro, se essas entidades continuam operando com boleto sem valor e boletos de proposta sem ter prévia autorização do cliente, estão operando totalmente fora das normas do BC. Desde 2012 o BC exige que se tenha data de vencimento, valor e, no caso de boleto de proposta, autorização prévia do pagador.

Para o terceiro setor, nós tivemos uma reunião há cerca de 1 mês e definimos como vai ser. O BC entende que o valor no boleto por ser R$ 0,00. Essas entidades, que são captadoras de recursos, poderão emitir boleto com o valor zerado. Mas, dentro do sistema de layouts, no momento em que o registro for feito no banco, esse boleto deverá ser registrado como sendo possível de recebimento com valor divergente (esse é o termo que está no layout) – e terá de ser definido qual o range (faixa) de recebimento que o boleto pode ter. Pode ser, por exemplo, de no mínimo R$ 10,00 e no máximo de R$ 1.000,00. Dentro disso, a pessoa poderá pagar qualquer valor.

Com relação ao boleto de proposta, uma circular do BC exige uma autorização prévia. Como esta autorização pode ser feita?

Desde que a empresa, se acionada pelo banco, tenha como comprovar a prévia autorização, a empresa pode usar o meio que achar melhor.

Os bancos vão oferecer sistemas online para registro imediato dos boletos?

Os bancos estão disponibilizando sistemas online de registro, para o caso do e-commerce por exemplo. Eu comprei agora e já quero pagar – a empresa tem de mandar para o banco e já registrar na base e na plataforma, caso contrário não consigo pagar em um banco diferente do emissor. Então, os bancos já estão desenvolvendo ferramentas online de registro. No momento do pagamento, o sistema do banco vai na base consultar se aquele boleto de fato existe, se está registrado.

E se o boleto não existir ainda, isto é, não tiver sido registrado?

Eu não consigo pagar esse boleto interbancos. Eu só conseguiria pagar esse boleto se o banco que eu pagar fosse o mesmo que emitiu o boleto.

O pagamento então seria bloqueado na hora?

Na hora, não vai esperar a compensação. É na hora do pagamento. No roll out, a partir de março/2017, inicia-se a consulta na base para boletos acima de R$ 50 mil. A partir daí, o banco obrigatoriamente vai ter de ir na base consultar. E eu só vou conseguir pagar o meu boleto se as informações que existem na cobrança baterem com as informações do boleto que está registrado na base. Para boletos abaixo de R$ 50 mil, continua a vida como é hoje. Até dezembro de 2017 teremos ondas, de ordem decrescente de valores (para validação/consulta na plataforma interbancária) – até o final de 2017, todos os boletos deverão ser consultados na base e não vai haver exceção.

O que vai acontecer com quem já emitiu boletos sem registro para 2017 inteiro, por exemplo?

Se porventura as empresas já emitiram boletos sem registro para 2017, para o pagador não vai ter alteração. O boleto que ele tem na mão continua válido. O que vai mudar é que o emissor do boleto vai ter de comunicar o banco e vai ter de registrar esse boleto.

Ou seja, o cliente vai conseguir registrar aquele boleto sem registro que ele já emitiu, certo?

Certo, ele vai conseguir registrar. O documento que está na mão do pagador continua válido.

Queria abordar um pouco o tópico segurança. Como vai ser mais fácil para os bancos detectarem os fraudadores?

Pra começar, o boleto só vai ser pago se estiver registrado na plataforma. E, para registrar, a pessoa precisa ir ao banco, abrir uma conta corrente, oferecer toda a sua identificação, ter um convênio – os bancos têm um processo de conhecer o cliente antes de oferecer este produto. O diretor de abertura de conta corrente tem todo um processo de responsabilidade junto ao BC. Existe todo um cuidado para a abertura de contas. Então boletos só poderão ser emitidos por empresas que tenham conta corrente regular, com tudo em ordem. Eu acredito que um fraudador não vai ter a cara de pau de emitir boletos sabendo que agora existe um processo de controle muito maior em cima dos boletos. Minha percepção é que ele não vai ter tanta facilidade pra fazer isso.

Um dos pontos diz respeito às diversas taxas que os bancos podem cobrar na modalidade com registro – registro, liquidação, baixa, permanência, protesto etc. Isso porque o banco nem sempre deixa isso de forma transparente. Existe alguma recomendação da Febraban para os bancos neste sentido?

Com relação a tarifas que os bancos praticam, a Febraban infelizmente não pode falar a respeito. Aí é entre banco e cliente. A Febraban não pode entrar nessa discussão.